Uma leve camada de neve na Praça Tiananmen cobriu ontem a cena de uma breve mas horrível tragédia. Os extintores de incêndio perto de algumas vans da polícia traziam lembranças horríveis.
Horas antes, às vésperas do Ano Novo Chinês, normalmente o festival mais alegre do calendário chinês, quatro mulheres e um homem presentes na praça se encharcaram com gasolina. Então, em um ato de desafio, ou talvez de pura loucura, eles se incendiaram.
O incidente lembrou imagens assustadoras do início dos anos 1960, quando os monges budistas se queimaram vivos em protesto contra o regime de Ngo Dinh Diem no Vietnã do Sul.
O governo chinês foi inusitadamente rápido em identificar os envolvidos como membros do Falun Gong, um movimento espiritual proscrito que tem sido perseguido pelas autoridades nos últimos dois anos. Pequim ridicularizou o Falun Gong [], mas não conseguiu conter seus protestos. Vários seguidores foram detidos anteriormente em protestos não relacionados em Tiananmen, onde tais episódios se tornaram um evento diário.
Mas, o Falun Gong negou ontem que os envolvidos fossem seguidores do movimento.
Testemunhas disseram que as mulheres cambaleavam, com os braços levantados, em torno de uma área da vasta praça. O homem permaneceu sentado, envolvido em chamas por alguns minutos antes da polícia as extinguir. As imagens de vídeo mostram uma coluna de fumaça saindo de um lado da praça enquanto os espectadores ficam horrorizados.
As vítimas foram levadas para a emergência de um centro médico. Uma mulher morreu mais tarde, de acordo com a agência de notícias oficial Xinhua, que disse que os cinco eram da província central de Henan. Ontem os sobreviventes estavam descansando no Hospital Ji Shui Tan, em Pequim, que se especializou em casos de queimaduras, mas não puderam ser entrevistados. A polícia de Pequim se recusou a fornecer mais informações sobre o incidente.
A polícia deteve uma sexta pessoa que estava transportando frascos de gasolina. Uma equipe de televisão da CNN que viu o incidente foi detida pela polícia e os videocassetes apreendidos.
Os membros do Falun Gong na China correm risco de prisão, até mesmo de morte, em sua persistente campanha para serem autorizados a praticar suas crenças idiossincráticas que combinam elementos de budismo, taoismo, exercícios de "qi gong" de respiração profunda e meditação. Nos últimos dois anos, eles usaram ocasiões como os feriados nacionais e do Ano Novo para apresentar suas crenças e embaraçar o governo com protestos altamente visíveis.
"Essa chamada tentativa de suicídio na Praça Tiananmen não tem nada a ver com os praticantes do Falun Gong porque os ensinamentos do Falun Gong proíbem qualquer forma de matar", declarou o grupo em um comunicado emitido em Nova York. "O Sr. Li Hongzhi, o fundador da prática, declarou explicitamente que o suicídio é um pecado."
A negação foi repetida ontem pelos representantes do Falun Gong em Hong Kong e na Austrália. "Para mim, nenhum praticante autêntico do Falun Gong faria isso", disse Holly Wei, porta-voz da organização em Sydney.
Outro porta-voz australiano, Michael Pearson-Smith, disse que uma das alegações da polícia de que as vítimas estavam "caminhando com os braços levantados em uma posição típica do Falun Gong" era completamente errônea, já que esse gesto não faz parte da prática do Falun Gong.
De acordo com o Falun Gong, o incidente na Praça Tiananmen é parte de uma campanha do governo chinês para desacreditar o movimento, dizendo que cada divisão do governo "inventou inúmeras mentiras contra o Falun Gong durante toda essa repressão".
Ontem, as autoridades tiveram poucas chances de novos protestos. A Praça Tiananmen estava cercada por veículos policiais identificados e não identificados, com vários outros estacionados na calçada coberta de neve no vasto espaço. Centenas de policiais e soldados uniformizados e a paisana verificaram os documentos de identidade de todas as pessoa que se aproximavam da praça para celebrar a chegada do Ano da Serpente. Algumas pessoas foram revistadas.
Alguns analistas acreditam que o incidente pode levar a uma nova repressão contra o movimento do Falun Gong, que até agora resistiu às vigorosas tentativas das autoridades de anulá-lo. Nos últimos dias, a mídia oficial publicou vários artigos anti-Falun Gong, acusando "elementos estrangeiros" de usar o grupo como uma "ferramenta" em uma tentativa de derrubar o governo.
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